20 de set. de 2013

Latim -- Primeira, segunda e terceira declinações

Achei que valeria a pena escrever um pouco sobre o meu processo de aprendizado. Nos últimos dias, antes de dormir, tenho passado quaisquer 10min tentando decorar [e achar lógica] nos grupos de declinações das palavras em latim.

[Caso não saibais o que são casos gramaticais (o que é nominativo, genitivo, dativo, acusativo ...), eu sugeriria ler a postagem que fiz quando estava aprendendo sobre sua existência e suas funcionalidades. Relendo agora notei algumas bobagens, mas acho que tá valendo. Ao menos não ficaríeis completamente perdidos]

Como comecei porque queria saber declinar direitinho a palavra thesaurus, acabei decorando a segunda declinação primeiro. Aqui, porém, começarei pela primeira, e explicarei a lógica que tento manter na minha mente na hora de decorar.

Substantivos que declinam segundo a primeira declinação são em sua grande maioria femininos. Algumas palavras masculinas relacionadas a ocupação (como poeta, agricola ou nauta), porém, também "adotaram" esse uso.

(Fonte: Wiktionary)
O Wiktionary ainda comenta sobre como a primeira declinação sugou algumas palavras do grego, e mostra tabelas com suas declinações. Porém, como as declinações dessas palavras, pelo que entendi, tendem a ser irregulares (e causar confusão ao aprendiz novo -- meu caso), acabei por ignorá-las temporariamente. Em todo caso, se encontrasse uma delas, declinaria de acordo com as regras em "stella", e suporia que o falante nativo [que já não mais existe, lol] seria capaz de entender.

Então, que lógica devo dizer que essas declinações seguem? Inicialmente, acho que me direis "nenhuma". Mas esperai até que eu apresente a segunda declinação, e aí muito mais sentido encontrareis.

Pois então? Que estamos esperando? Vamos à segunda declinação!


(Fonte: Wiktionary)
Em oposição à primeira declinação, composta primariamente por palavras femininas, substantivos na segunda declinação são normalmente ou neutros ou masculinos. Novamente, o Wiktionary comenta sobre a existência de palavras femininas vindas do grego que também declinam da mesma forma. Como eu sou principiante ainda, resolvi ignorá-las completamente.

Normalmente, o nominativo singular da segunda declinação termina em um (para neutros) e us (para masculinos). Mas isso me pareceu estar longe de ser a regra, e o Wiktionary inclusive apresenta os exemplos ager e puer.

Bom... finalmente cheguei a um ponto onde eu posso começar a achar lógica na minha decoreba. A existência de dois grupos de declinações que "se opõem" um ao outro me permite notar algumas regras. A primeira coisa a notar é a seguinte: olhai como os o's tornam-se a's na maioria das declinações, ao converter uma palavra do masculino para o feminino. A única exceção é o acréscimo de um e no dativo singular da primeira conjugação. Esse acréscimo, aliás, é a única diferença entre o dativo e o ablativo.

[diga-se de passagem, o Wiktionary inclusive comenta sobre como "filia" declina como "filiabus" no dativo -- ou seja, de acordo com outra regra --, só para fazer distinção entre "aos filhos" e "às filhas"]

Para saber o nominativo plural, normalmente olho para o genitivo singular. Exceto os nomes neutros, ambos normalmente são idênticos. Os nomes neutros, por sua vez, são ainda melhores: nominativos, acusativos e vocativos são idênticos \o/

Ainda cuidando os gêneros, notai como acusativos singulares declinam com "a vogal do gênero" + m, e como os plurais declinam idênticos ao português (exceto os nomes neutros -- leia o parágrafo acima).

Por fim, sobram vocativos (idênticos ao nominativo, fora o e da segunda declinação) e genitivos plurais (esses eu relacionei aos sufixos ário e ório do português [como em tributário -- ou seja, "de tributo" --, e classificatório -- ou seja, "de classificação"], que normalmente me indicam o caso genitivo).

...

Daí me vieram os nomes da terceira conjugação, e bagunçaram todas as minhas regras mentais. Ali, qualquer gênero é permitido, e o nominativo nem serve pra achar a raiz da palavra (já que é frequentemente diferente dos outros casos). Mesmo assim, ao menos ele sempre idêntico ao vocativo.

(Fonte: Wiktionary)
Se a letra "tema" da primeira conjugação era o a, e a da segunda era o o, na terceira conjugação ela definitivamente é o e. No acusativo, por exemplo, basta pegar a segunda declinação e substituir os o's por e's. O i do genitivo singular também vira e no nominativo plural; e o ablativo singular, que antes "combinava" com o português (e com o espanhol), agora também recebe um e pra diferenciar.

Agora, ambos masculinos e femininos declinam idênticos. Os neutros, por sua vez, seguem exatamente a mesma "regra" da segunda declinação: nominativos, acusativos e vocativos são idênticos, declinando em -a no plural.

Finalmente, dativos e ablativos ganham -ibus no plural -- o que pra mim tornou bastante óbvia a etimologia da palavra ônibus.

Algumas palavras na terceira declinação também recebem um i antes de algumas declinações. Se há alguma regra para descobrir quais palavras o fazem e quais não, não consegui descobrir. Pelo visto, será mais algo a decorar -- o que, admito, me é meio frustrante.

...

Daí perguntar-me-eis "e os adjetivos?"... afinal, adjetivos podem assumir qualquer gênero (concordando em gênero com o nome que modificam). De fato, o maior motivo por eu ter escrito tudo até aqui foi justamente a descoberta: os adjetivos declinam "igual"! Tomemos por exemplo o adjetivo veteranus (veterano):

(Fonte: Wiktionary)
Notai o escrito "Inflection: First/second declension". Isso significa que, para o gênero feminino, essa palavra segue a primeira declinação (igualzinho a stella, lá em cima), enquanto, para os gêneros masculino e neutro, ela segue a segunda declinação (igualzinho a dominus e forum, lá em cima). Tri, não?


Pelo que percebi, os particípios presentes (amante, andante, paciente, potente), quando "adjetivados", declinam, daí, de acordo com a terceira declinação (olhai aí do lado). Da tabela ali, dá inclusive pra ver daonde saiu o nosso particípio presente: até onde sei, ele é formado pelo "acusativo sem o m" (ignorai o "neutro", já que, até onde também sei, ele foi "droppado" bem cedo pelo "vulgus").

...

Bem, por enquanto, isso é "tudo" (tem mais algumas coisas, mas, enfim, eu ainda não to seguro quanto a se realmente as sei) que eu tenho aprendido até agora. Por enquanto, to deixando o francês de molho... mas eu já sei que sou assim: de tempos em tempos crio alguma coisa nova, me dedico totalmente a ela, até que enjôo e mudo pra outra. Passado algum tempo eu volto pra primeira coisa e me dedico affuuuu denovo... e aí me desenvolvo um pouco mais. Certamente não será diferente com essas línguas, apesar de eu duvidar da possibilidade de um dia ler tranquilamente em latim xP

Tomara que a postagem tenha sido interessante =)

R$



4 comentários:

  1. Comentários a facão:

    Uma coisa que eu me liguei em algum ponto da minha existência (mas nunca fui conferir em nenhuma fonte confiável) foi que o latim assimilou os 'ts' e 'ds' do PIE pra 's/ss' ('ss' entre vogais, 's' otherwise, acho). Isso explica algumas das declinações irregulares, e.g., "potens" é na verdade "potents" pós-assimilação, "miles" na verdade é "mil{e/i}ts", etc.

    Acredito que fenômenos análogos expliquem outras declinações irregulares, e.g., "virgo" provavelmente é "virgon" depois de o 'n' ter droppado. Ok, o "virgO" vira "virgInes" por algum motivo. Vou jogar a culpa no "e/o ablaut" do PIE + alguma regra que transforma 'e' em 'i' nesse contexto (sílaba pós-tônica não-final?) em latim e deixar por isso mesmo. :P

    Outra detalhe é que usar "X" pra escrever "CS" foi uma das piores decisões que os romanos tomaram. Tipo, "lux" é na verdade "luc-s"; a terminação é "-s"; o que explica a declinação "lux (= lucs), lucis, lucem, luces, ...". De maneira análoga, "rex" é na verdade "rec-s" (que é "reg-s" pós unvoicing em contado com o 's'). E "nox" é "noc-s", que é "noct-s" pós assimilação do 'ts' para 's'.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Eu já tive essa sensação de que o "X" vira "alguma coisa", mas ainda não tinha conseguido me ligar do quê virava. As três palavras que eu conhecia que terminavam com "x" eram "nox", "rex" e "atrox", só...

      Tipo... eu tenho sensação de que esse X aí é meio coisa de "gramático chato que quer complicar". Mas ao mesmo tempo eu admito que acho bonitinha a troca.

      Sobre o PIE... eu acho tri ver essas conexões PIE --> descendentes, mas eu não tenho conhecimento nem de PIE nem de latim suficiente pra chegar a qualquer conclusão dessas.

      Aliaś, tava me perguntando sobre se não existiria algum "grupo de falantes de latim" em PoA em que eu pudesse me enfiar pra ver até onde eu consigo ir u.u Sei lá... só meu medo é essa gente ser maconheira, toda louca (porque me parece bem o "público alvo" de alguém que queira aprender latim -- no prejudice intended =S).

      Excluir
    2. Gente maconheira toda louca? Nah, acho que no máximo uns maconheiros sãos. :P Mas mais provavelmente um pessoal mais idoso que aprendeu latim no colégio e uma galera mais nerd. Se tu descobrir um grupo de falantes (já ouvi dizer que tem) me avisa, que eu também pilho. Se não tiver a gente bem que podia começar um e espalhar cartaz na UFRGS. Eu sei é que tem fórum de monte na Internet...

      Excluir
  2. Gostais de Pão?

    ResponderExcluir