19 de nov. de 2013

Expressões Multipalavras

Nos últimos 10 meses or so, eu venho trabalhando, no grupo de Processamento de Linguagem Natural, com um tópico que, se não se demonstra o meu maior interesse quando o assunto é lingüística, pelo menos se tornou um "assunto amigo" sobre que me é interessante conversar: Expressões Multipalavras.

O leitor deve [ou não] ter notado os [até que] freqüentes [demais] grifos no parágrafo anterior. Todos eles são exemplos -- em níveis diferentes de "rigidez" -- desse fenômeno recorrente através das línguas do mundo. Inclusive o próprio nome: "Multiword Expression", em inglês. Os grifos prosseguirão ao longo dessa postagem, evidenciando (ou, como eu gostaria de dizer, "evendo") o quão comum é essa classe. Aliás... eu poderia grifar até mais do que o faço; mas haveria discordantes, talvez, sobre se um grupo de palavras faz ou não parte de tal conjunto.

De fato... não precisamos ir muito longe: o motivo que me levou a escrever essa postagem foi que eu disse que a perícia médica deveria ter recomendado o uso de óleo de peroba, de 12 em 12 horas, pelo José Genoíno, tamanha a sua cara de pau.

Aí talvez o leitor se pergunte: mas por que diabos [sério... eu não to forçando o uso dessas expressões ] é que se usam essas expressões? Ou seja... como é que a língua "evolui" de forma a, com o tempo, desenvolver esses conjuntos "semi-fixos" de palavras? A resposta é grande, mas em sua versão resumida se limita a "não sei" [só sei que foi assim].

O que eu sim sei é que isso já ocorre desde línguas muito antigas -- e muitíssimas das nossas palavras de hoje são decorrentes desse tipo de coisa.

Quando eu comecei a escrever meu TCC, eu tinha alguns artigos através dos quais eu me baseava e aos quais eu gostaria de fazer referência na seção de "trabalhos relacionados". Como eu me sentia inseguro de referir sem muito conhecimento, comecei a ler freneticamente vários artigos, vários dos quais referiam outros artigos. É óbvio que nisso eu acabei caindo numa toca de coelho ("rabbit hole" -- parece que se tem usado essa expressão na internet ultimamente): referências referiam outras referências, num loop infinito do qual eu só conseguia fugir quando não era capaz de encontrar certo livro na internet.

Bom... o resultado foi que, no fim das contas, eu li até que bastante sobre as diferentes áreas que estudaram esse fenômeno. Por exemplo, um pessoal do leste europeu começou uns estudos sobre uma tal de "fraseologia", por exemplo, que engloba boa parte do que hoje chamam de expressões multipalavra; um outro cara chamado Otto Jespersen definiu a palavra "formula" pra se referir a tudo o que é "retrieved as a whole" (recuperado "como um inteiro") pela nossa memória durante a fala, em vez de dependente das regras da gramática [sintática- ou fonologicamente]  -- e aí várias pessoas passaram a usar termos como "prefabs", "formulaic language" (língua formuláica) e "formulaic sequence" (sequência formuláica) para se referir a esses fenômenos.

Mais um grifo... dessa vez do Dragon Quest xP


Enfim... esse é simplesmente o primeiro, o mais simples, mais introdutório, e provavelmente menos direto texto meu sobre esse assunto. Já deu pra perceber, pelos grifos do meu texto, expressões multipalavras são coisa recorrente, tanto na nossa fala quanto na nossa escrita. De fato, tem um tal de Ray Jackendoff que chegou a estimar que elas compõem cerca de 50% do nosso vocabulário nativo (diga-se de passagem, alguns outros caras defendem que são justamente essas "expressões formulaicas" que denunciam os falantes não-nativos de que eles não o são), e eu acredito nele: apesar de certamente mais de 50% do total deste texto não serem grifos, tem muitas expressões mais que poderiam estar grifadas. É o caso dos superlativos no início desse parágrafo, por exemplo. Afinal, em português, constróem-se os superlativos através da formação "artigo + mais + adjetivo", formação essa composta por mais de uma palavra. E o que falar sobre os verbos que exigem preposição? E os reflexivos? E os nomes de pessoas? [o Jackendoff os contava]

Não importam muito, na verdade, quais são os limites que definem quando uma construção "entra como" uma expressão multipalavra ou não. O que importa, no momento, é que elas existem... que são freqüentes demais para serem ignoradas, ao passo em que, na verdade, elas o são.

Enfim... eras isso...

Próximas postagens deverão focar em assuntos mais bem definidos e [quem sabe?] mais interessantes xP

R$

2 comentários:

  1. O mais legal (?) é quando uma dessas expressões fica tão fixa que as pessoas nem sabem mais o significado dos elementos, como em “faixa etária”, que alguns preferem especificar e criam o tal de “fachetária de idade” :-)

    Este caso está em transição, ainda há pessoas que sabem o que significa “etária”.

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    1. Sim sim... eu vejo pelos "classificação etária", que sempre precisam de uma reexplicação posterior u.u

      EE... na real, tem até que bastantes dessas. Uma que me chama atenção é o "quem me dera", daonde a gente nem nota que o "dera" é do verbo "dar" conjugado no pretérito mais-que-perfeito (um dos únicos usos dessa conjugação que ainda subsiste).

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